5.5.14

de prelo (ainda não)

 Na margem de tudo o que é dito, antes e depois do discurso, há um vão, que se abre entre a epiderme e a embriaguez do que é vulgar e divino, neste buraco escondemos o que nos é mais precioso, é inominável por isso, sem rosto, sem cheiro, sem altura, escorre junto ao phatos, e tem um ar de fôlego que resseca a razão, pende como um escroto pendular entre as pernas de Netuno Negro vendendo Tridents no vagão do metrô da linha vermelha, e pode gerar proles, pode erigir sonhos, lembranças, desejos, tudo aquilo que a gente guarda bem esquecido no canto escuro da casa, como um corpo assassinado, mas que logo começa a cheirar, e antes que todos percebam, estamos lá, remexendo naquilo, tentando encontrar algum lugar seguro para esconder novamente, sem ousar olhar para a coisa, tateamos cegos o que poderia ser nossa salvação, nossa única virtude, a única coisa que podemos olhar a fisionomia e dizer, isso é meu, nosso pecado mais original, a única coisa em que realmente podemos nos fiar e que fazemos questão de esconder no escuro inalcançável de nossos corações...