12.6.15

de Juncos

me empresta aquele dia
em que me atiraste ao rosto
o junco - resto daquilo que foi flor
como se me devolvesse cego
perdido do que deveria me pertencer
mas que não é meu
porque dormia quando o perdi
e durmo ainda - que é no sonho que lembro
daquele dia emprestado
da cova que cavamos prum jardim
lembra? foi ali que nos enterramos
pés de algodão, adubo de Abel verde
dorso de formigueiro, cupim
como bolo de carne em meio as folhagens

durmo mais fundo que o sono
lá onde os mortos não vão
lá onde os sonhos são molhados
onde as aguas são vermelhas
e não ha seiva nem sangue
somente os olhos que borbulham
nem ha fe nem razão nem emoção
somente cílios cerrados
que são como raízes mínimas
rasgando a semente
forjando o fruto e os membros
que se dobrarão joelhos diante de ti
abraços que se alongarão no horizonte
e a boca que será brutal com a gente
com dentes língua e silêncios
com a mordida incerta na altura da nuca
e o sono chegando pra este sonho
porque é nele que me lembro
do minuto emprestado
da cova que cavamos
e do junco - ah o junco!
resto daquilo que foi flor